Comunidade terapêutica é alvo de ação do MP, em Laguna

Na ação, a 3ª Promotoria de Justiça da Comarca de Laguna pede tutela antecipada de urgência, para a condenação dos responsáveis ao cumprimento da obrigação de não fazer, consistente em se absterem de retomar os trabalhos da comunidade terapêutica ou de atuar em entidades da mesma natureza que não estejam regularizadas.

O Ministério Público ajuizou ação civil pública contra os responsáveis por uma comunidade terapêutica de Laguna, acusada de internações à força, cárcere privado e administração forçada de medicamentos sem prescrição médica, entre outras violações de direitos flagradas.

Na ação, a 3ª Promotoria de Justiça da Comarca de Laguna pede tutela antecipada de urgência, para a condenação dos responsáveis ao cumprimento da obrigação de não fazer, consistente em se absterem de retomar os trabalhos da comunidade terapêutica ou de atuar em entidades da mesma natureza que não estejam regularizadas. O MP pede ainda a condenação à compensação dos danos morais causados às vítimas ilicitamente acolhidas e à coletividade. As informações são do jornal Folha Regional.

Em março deste ano a promotoria recebeu a denúncia das possíveis irregularidades que estariam sendo cometidas no local pelo presidente e colaboradores da Comunidade Terapêutica. O mesmo presidente está sendo alvo de outra ação civil pública, nesse caso em Braço do Norte, por irregularidades em outra Comunidade Terapêutica.

Ainda em março, o local, na Estrada Geral da Barbacena, em Laguna, recebeu fiscalização conjunta determinada pela promotora Bruna Gonçalves Gomes e integrada por Polícia Militar, Corpo de Bombeiros, Vigilância Sanitária municipal e Assistência Social do município. O imóvel tratava-se de um galpão com muros altos que impediam qualquer visibilidade. Os dois portões estavam totalmente fechados, com cadeado, e sequer havia campainha ou interfone.

Durante a vistoria as autoridades concluíram que a Comunidade Terapêutica, precária e irregular, não possui recursos humanos capacitados, já que os próprios acolhidos realizam as funções de monitor e coordenador; não conta com os ambientes mínimos necessários; não exige prévia avaliação médica para o acolhimento; não possui programa nem plano terapêutico individual; e não conta com alvará sanitário ou autorização de funcionamento emitidos pelos órgãos competentes.

Cárcere privado, agressões e medicamentos de uso controlado

Alguns acolhidos afirmaram que chegaram ao local à força e contra a vontade, sofrendo agressões físicas e ingerindo medicamentos controlados sem prescrição médica para que permanecessem ali. Contaram que quando alguém chegava contra a vontade, tentava fugir ou descumpria as normas era colocado na Unidade de Desintoxicação.

Também foram identificadas pessoas com transtornos psiquiátricos graves e deficiência intelectual, as quais não fazem parte do público-alvo das Comunidades Terapêuticas nem poderiam estar acolhidas na instituição.

A fiscalização flagrou um dormitório extra, insalubre, desprovido de iluminação e ventilação adequada, a Unidade de Desintoxicação, onde alguns acolhidos permaneciam trancados praticamente o dia todo, durante dias, e que o cadeado somente foi aberto em razão da chegada da equipe de vistoria. Naquele momento foram contabilizados seis homens em situação de cárcere privado.

Eles narraram agressões constantes, inclusive com tacos de beisebol, e ingestão forçada de medicamentos para estarem constantemente dopados, a fim de evitar conversas e fugas, a partir de uma solução chamada “bate-gute”. Um deles explicou que a mistura os leva a ficar, por vezes, três dias totalmente desacordados.

Diante dos relatos, a Polícia Civil foi acionada e localizou no imóvel um taco de beisebol, um facão e um par de algemas, além de medicamentos de uso controlado. Foi lavrado auto de prisão em flagrante contra três responsáveis pela instituição.

Comunidade Terapêutica foi desocupada após vistoria

O coordenador informou que a cobrança de valores varia conforme a capacidade financeira do acolhido e da família: R$ 600 (valor do auxílio), R$ 1 mil ou um salário mínimo.

Disse que o prazo máximo para permanência na instituição é nove meses e o prazo mínimo é de três a quatro meses para desintoxicação e que são realizadas aulas do CEJA uma vez por semana, atendimento psicológico duas vezes na semana e atendimento religioso cerca de três vezes na semana.

Os acolhidos de forma voluntária andavam livremente pela estrutura da instituição, não eram obrigados a fazer a ingestão inadequada de medicamentos e poderiam desistir do tratamento caso desejassem, segundo seus relatos.

Durante a fiscalização havia 48 homens de diversas cidades do Estado acolhidos na Comunidade Terapêutica, dos quais apenas 22 se enquadravam no perfil de acolhimento – dependentes químicos solicitando acolhimento voluntário. Desse total, 20 foram vítimas de acolhimento forçado. Foram identificados ainda 13 homens com deficiência intelectual ou transtornos psiquiátricos graves e dois idosos que necessitavam de cuidados especializados.

O Corpo de Bombeiros Militar pontuou que a edificação não tem projeto preventivo de incêndio nem atestado de habite-se e atestado de funcionamento. Verificou também a existência de grave risco em razão da superlotação. A Vigilância Sanitária do município flagrou irregularidades até mesmo no armazenamento de alimentos, motivo pelo qual também foi realizada a interdição sanitária.

A partir dos desdobramentos da operação conjunta, notadamente a prisão em flagrante dos responsáveis pela Comunidade Terapêutica e a interdição do local, a equipe do Ministério Público e da Assistência Social, com auxílio da guarnição da Polícia Militar, providenciou a desocupação total do imóvel, finalizada em 15 de março.