Previous slide
Next slide

Médico e prefeito três vezes, Paulo Carneiro nos deixava há 30 anos

Médico humanitário, político, professor e membro ativo da vida social lagunense, mineiro de Ubá marcou época na medicina.
Previous slide
Next slide

Achar contemporâneos deste mineiro pode ser tarefa difícil. Fácil mesmo é encontrar as referências que ainda hoje estão presentes em nosso cotidiano e que ajudam a lembrar a história deste médico que marcou época. Nesta sexta-feira, 6, transcorre a passagem dos 30 anos em que Laguna se despediu de Paulo Carneiro, o “seu doutor”.

Um dos doze filhos do casal Domiciano e Maria Luiza, o menino Paulo nasceu em 25 de janeiro de 1907, na calma Ubá, uma cidade distante cerca de 4 horas capital mineira Belo Horizonte. Ainda jovem, por volta dos 12 anos, teve o primeiro conselho para que seguisse o caminho da medicina. “Tinha um médico lá em Ubá, grande figura, o doutor Felipe Balbino, que me levou uma vez para ver um homem, que teve o braço esmagado por uma tora, e ele ficou admirado porque aguentei firme e o chofer desmaiou. Ele dizia: ‘Você tem que ser médico, Paulo, você dá para isso’”, contou, em depoimento aos netos, numa gravação feita pouco antes de falecer.

Os estudos iniciais foram na terra natal, mas a formação como médico buscou no Rio de Janeiro e por lá ficou até 1931, quando aceitou convite para vir para Laguna. “Eu fui para Santa Catarina ser diretor do hospital, ganhando 800 contos de réis por mês”, recordou o médico na mesma entrevista. O convite foi feito por Luiz Fonseca, então provedor, que viria a ser seu sogro.

Ouça: Reportagem especial sobre os 30 anos de falecimento de Paulo Carneiro

“Naquela época o hospital tinha apenas um médico, que era responsável por tudo”, narra a ex-presidente do hospital lagunense, Regina Ramos dos Santos, coautora de livro que fala da trajetória da enfermagem na cidade. “Durante a 2ª Guerra, nos anos 40, ele foi um dos criadores da escola da Cruz Vermelha, em Laguna, e na época, a Legião Brasileira de Assistência Social, presidida pela primeira-dama dona Darcy Vargas, organizou em todo o Brasil cursos de enfermeiras-socorristas, e aqui uma turma foi formada pelo doutor Paulo Carneiro e outros profissionais que o ajudaram”, lembra.

A filha Ruth Maria recorda que a medicina foi uma das grandes paixões do pai, que não deixava de atender nenhum paciente, pelo contrário, não importa onde fosse ou horário que o relógio marcasse, ele ia. Por isso e outros motivos ficou conhecido como ‘pai dos pobres’, e clinicava mesmo após a aposentadoria.

“Foi um homem que viveu em função de melhorar um pouco a vida das pessoas pobres. Na hora do almoço, nossa casa tinha uma fila na varanda”, recorda. Ruth é a única mulher dos três filhos do casal Paulo-Ludinira Fonseca, os outros são: Sérgio, hoje in memorian, e Luiz Paulo, que foi proprietário do antigo Semanário de Notícias. “Ele não dizia não. Tanto é que eu perguntava: ‘Vovô, quando é que o senhor descansa?’ e ele dizia: ‘Descanso quando Deus permite’”, lembra o neto Eduardo Nacif Carneiro, vereador em Laguna pelo União Brasil.

Paulo Carneiro e a família na inauguração do busto nos anos 70. Arquivo.

Três vezes prefeito

“Laguna tem um novo prefeito. Acendendo ao convite feito pelo senhor interventor federal no Estado, foi nomeado e empossado ontem o senhor doutor Paulo Carneiro como prefeito”, anunciou o antigo diário O Estado, ao falar da nomeação do médico para a prefeitura. Era o dia 6 de novembro de 1945.

Paulo Carneiro ainda voltaria ao governo municipal como prefeito por duas vezes, no começo da década de 1950 e depois na década de 1960. Era uma época em que a cidade tinha nomes de orgulho na política, como Walmor de Oliveira e Juaci Ungaretti – também prefeitos no período.

Como prefeito, abriu estradas, fez escolas e buscou melhorias. Mas não foi só na política que ele se destacou. O médico também tinha a sua vida social e participava ativamente da sociedade lagunense.

Ao longo de sua vida, foi professor no Ginásio Lagunense, presidente e fundador do Rotary Club em 1946, além de comandar por 16 anos o Clube Blondin. Sob sua gestão, a entidade social fez construir a sede reformada três anos atrás. “Foi muito difícil; não tínhamos um orçamento específico e faltava-me experiência no assunto. Tudo o que é feito com amor e carinho, porém, sempre dá certo. Eu tenho muito orgulho disso”, declarou em entrevista ao Blondinista, jornal comemorativo editado em 1991.

Em meio à essas atuações sociais, a filha Ruth lembra que o pai adorava parar para apreciar o pôr-do-sol. Isso também é confirmado pelo oftalmologista Henrique Packter, de Criciúma, em relato escrito especialmente para o Portal. “Laguna estava no seu sangue. O amor que dedicava à cidade onde viveu a maior parte da vida, fez com que pedisse que lá fosse sepultado, naquele lugar onde vira o mais bonito pôr do sol do mundo. O local que escolhera para viver, criar raízes e sua família”, descreve o criciumense, que conheceu e manteve amizade com o mineiro de Ubá.

Como quem busca inspiração, após entrevista na praça, neto Eduardo observa homenagem. Foto: Luís Claudio Abreu/Agora Laguna

Reconhecimento da sociedade

Antônio Monteiro de Souza é morador de Caputera e conta que o futebol na localidade começou a se desenvolver nos anos 40, assim como em outros bairros da cidade. Um dos times mais antigos, o Sete de Setembro, evoluiu para chegar à atual Sociedade Esportiva Paulo Carneiro, que até hoje cita no hino, escrito pelo irmão, Heleodoro Monteiro, o verso: “Paulo Carneiro / Um doutor muito honrado / Empresta o nome / Para esse time estimado”.

“Meu pai [que era amigo] resolveu falar para saber se ele aceitava colocar o nome do time como Paulo Carneiro, e ele aceitou. Até tenho uma foto com ele, meu pai e o Luiz Paulo”, conta Antônio.

Para o presidente atual do time, Saulo Pereira, a homenagem é motivo de orgulho. “Para nós, da comunidade, sempre que o time sai para jogar amistosos ou campeonatos, a gente sempre procura fazer o melhor para respeitar esse nome”, diz o dirigente tricolor.

Quando ainda era pertencente à Laguna, a escola de Santiago (hoje, Pescaria Brava) recebeu o nome de Paulo Carneiro. A homenagem também foi replicada na principal rua de Cabeçuda, na Policlínica no bairro Magalhães, em uma praça no Centro Histórico. Mas a homenagem maior foi um busto, feito ainda em vida – equiparado ao desfile feito pela Vila Isabel com sua história como enredo e letra que ainda hoje é lembrada.

“Fez por merecer o imenso prestígio que desfrutou em Laguna, que o homenageou com um busto em praça pública, em vida. Recebi o convite para participar do evento, enviado pelo próprio Paulo Carneiro. Tenho-o até hoje: ‘Henrique, veja só, fui bustificado! [sic]’”, lembra Packter, que recorda que o homenageado só topou a iniciativa se a comunidade abraçasse o projeto – o que foi feito.

Nos 30 anos do falecimento do ‘pai dos pobres’, o neto Eduardo revela um desejo: “Uma ideia que estou trabalhando é tentar montar um instituto. Demanda planejamento, tempo, apoio, mas é um projeto que ainda quero realizar. E agora, nesses 30 anos, tive a ideia de colocar um QR Code e estou conversando com a prefeitura e Iphan para revitalizar a praça para que as pessoas mais jovens conheçam o vovô Paulo”, conclui. Paulo Carneiro foi sepultado em 1993 na cidade de Laguna, atendendo ao desejo pessoal.

Time campeão do Paulo Carneiro no Amador de Laguna em 2021 – Divulgação

 

Previous slide
Next slide

Notícias relacionadas