Previous
Next

Exclusivo: O que dizem os PMs envolvidos no caso Diego Scott em seus depoimentos

Nesta sexta-feira, 5, o caso do desaparecimento de Diego Scott, 39 anos, completa três semanas e ainda está sem solução. No começo da semana, a família e a polícia acompanharam uma operação de esvaziamento de uma piscina desativada na praia do Gi, que não resultou em novidades. Ontem, uma manifestação pediu respostas para o caso.

Durante uma discussão familiar entre ele e o pai, Edson Scott, a Polícia Militar (PM) foi acionada para apartar a situação. De acordo com a esposa, Alexsandra Joaquim, 41, isso era recorrente e Diego, que é dependente químico, era sempre liberado – exceto uma vez, quando houve agressão a ela.

Dois policiais foram até a casa onde a discussão ocorria, no bairro Progresso, conversaram com a família e levaram Diego na viatura. Mas no boletim de ocorrência, a versão oficial era de que o homem havia se “evadido do local” e não estava presente na hora da lavratura do documento.

Depoimentos dados pelos dois policiais em 18 de janeiro, três dias depois da ocorrência, mostram que eles mantiveram a versão. Os relatos foram obtidos pelo Portal Agora Laguna e fazem parte do processo de sindicância interna aberto pelo 28º Batalhão de Polícia Militar (BPM) da cidade. Os documentos foram escritos em terceira pessoa, por terem sido registrados por um escrivão da polícia. Eles são assinados pelos agentes, a capitã responsável pela auditoria e o policial que transcreveu os relatos.

Um dos militares registra no depoimento que “já conhecia Diego pelo fato de ser usuário de drogas e também de ter atendido várias ocorrências na casa do mesmo. Que também já conhecia o sr. Edson de ocorrências anteriores da mesma natureza”. No mesmo dia, mais cedo, a polícia já havia sido chamada na residência da família e que durante a tarde fora acionada novamente. Ainda segundo o agente, o pai de Diego e a mãe, Maria da Graça, foram orientados a representar contra o filho e pedir medida protetiva, mas não quiserem seguir adiante.

“Até esse momento, o declarante não havia percebido a lesão no nariz do Sr. Edson. Que o declarante e o [outro policial] foram para dentro da casa, juntamente com o Sr. Edson, e pediram para o Diego sair. Que o Diego saiu e informou que ‘iria se virar na Malvina’, que ‘era de facção criminosa e que não ia voltar mais’, que ‘se era assim que eles queriam, não voltariam mais para casa’”. De acordo com o relato, nesse momento, o desaparecido saiu da residência e não teria sido mais visto, foi quando a guarnição percebeu que o nariz do pai estava sangrando.

“Quando saíram da casa, observaram que Diego estava gritando na esquina. Que colocou no boletim de ocorrência que Diego não estava no local porque quando lavraram o procedimento, ele já havia saído”, registra o depoimento deste policial. O relato prossegue com a informação de que o BO foi lavrado na casa de Edson Scott e que ao sair do local, não havia sinal do desaparecido. Segundo o policial, a guarnição teve de retornar à residência para entregar ao pai um documento que havia permanecido em posse dos agentes, mas ele não estava lá, apenas uma mulher. “Não viram mais Diego ao longo do turno de serviço”, diz trecho do relato.

Essa versão foi confrontada dois dias depois, quando surgiu o vídeo gravado pela câmera de vigilância de uma casa vizinha à da família. Questionados, os agentes mudaram as versões.

“Que após o encerramento do boletim de ocorrência, foi observado que Diego estava na esquina falando. Que entendeu que, como já havia encerrado o BOCOP [boletim], não cabia mais a prisão de Diego. Que o depoente acreditou que o crime era de menor potencial ofensivo, o que caberia a lavratura de um termo circunstanciado, tendo em vista que vítima era idosa, razão pela qual não conduziram Diego. Que se Diego estivesse presente a guarnição do depoente lavraria um termo circunstanciado por lesão corporal. Que após saírem da residência do Sr. Edson, a guarnição visualizou Diego na esquina e o abordaram, realizando busca pessoal e o algemaram, tendo em vista que Diego estava muito alterado, se batendo e alcoolizado”, diz o segundo policial envolvido.

O desaparecido não tinha nada de ilícito consigo, conforme a revista realizada mostrou. “Objetivo dessa condução era para que Diego não retornasse mais na casa de seu pai, evitando maiores incomodações [sic] naquele dia. Que soltaram Diego nas imediações do Laguna Internacional em uma estrada de chão, que fica cerca de 100 a 300 metros da via principal. Que neste local apenas retiraram as algemas de Diego e disseram para não incomodar mais. Que a guarnição do depoente não fez uso de spray de pimenta, nem qualquer outro equipamento”.

O relato continua: “Durante o trajeto, o depoente e seu parceiro foram conversando com Diego e este foi se acalmando, de modo que quando soltaram-no, Diego já estava mais calmo”. Segundo o depoimento, os policiais voltaram à casa de Edson para a entrega do documento, em viagem que durou 15 minutos, e foram questionados pela mulher que os atendeu se o desaparecido havia sido preso. “A guarnição PM disse que não pois não haveria motivo” e continuou “as rondas rotineiras até o final do turno de serviço”.

Diferente do primeiro depoimento, este teve acompanhamento do advogado de defesa dos soldados. “O escrivão do depoimento registrou que o “defensor do depoente solicitou a consignação neste depoimento de que algumas pessoas teriam comentado ter visto Diego nos dias posteriores à abordagem policial” e que “a informação repassada à guarnição do PPT e ao subcomandante do Batalhão”.

Foto: Elvis Palma/Agora Laguna

PM confirma mudança de versões

A reportagem do Portal Agora Laguna buscou o posicionamento da Polícia Militar (PM) referente aos depoimentos. A corporação confirma que houve a mudança nas versões.

“O que nós temos de fato até agora: ele foi colocado na viatura policial militar e não foi levado para uma repartição pública. O que aconteceu a partir dali ainda é um mistério. fala o subcomandante, major Josias Machado. E completa: “Se for provada alguma situação, eu reafirmo: a PM é intransigente com quem transgride a lei, seja o civil, seja o policial militar”.

O oficial ressalva que possíveis punições aos agentes só serão definidas após a conclusão do inquérito investigativo e ressalta que a PM tem feito várias ações visando auxiliar na resolução do caso.

“As diligências que surgem são resultado de informações sobre o paradeiro dele e são apuradas com todas as nossas forças. Já colocamos o canil, a Rocam [Rondas ostensivas com apoio de motocicletas] e até mesmo o helicóptero Águia, que veio para a Operação Veraneio, já fez diversas buscas aqui pela região, tentando localizar vestígios do Diego Bastos Scott, mas, infelizmente, não conseguimos nenhum indício”. Buscas em hospitais e clínicas da região também foram feitas, assim como em Florianópolis e Criciúma, onde informações disseram que ele poderia estar.

O major também frisa que a corporação visa fazer uma investigação da forma mais transparente possível e elucidar o caso. “Os familiares já foram recebidos aqui, por mim mesmo, e todas as informações que foram passadas por eles ou outras pessoas estão sendo apuradas […] Tudo o que está ao nosso alcance foi feito, para que se conseguisse descobrir onde está o Diego”.

Familiares realizam nova manifestação em frente ao Fórum

Ontem, a família fez nova manifestação em frente ao Fórum da Comarca de Laguna. “É um desespero, a gente já não tem mais onde procurar. Todo mundo aqui na cidade está vendo o sofrimento da família”, comentou a esposa Alexsandra Joaquim, 41 anos, durante o manifesto.

Ao todo, cerca de 50 pessoas participaram do ato nesta quinta. Na próxima semana, familiares irão até a corregedoria da Polícia Militar em Florianópolis para buscar mais detalhes sobre a apuração que está sendo realizada em um Inquérito Policial Militar (IPM).

“Ainda não temos novidade. A família segue nas buscas em outros pontos da cidade e aguardando informações que leve ao paradeiro dele”, destacou o advogado da família Breno Schiefler Bento.

Advogado de defesa explica versões

Luís Fernando Nandi Vicente, advogado que cuida da defesa dos soldados, explicou à reportagem do Portal neste sábado, 6, as justificativas para a mudança das versões nos dois depoimentos dados à corregedoria.

“Há um entendimento de que eles tiveram uma alteração da versão deles entre o primeiro e o segundo depoimento quando eles disseram que o Diego não estava. […] Não quer dizer que não viram o Diego naquele dia, mas sim que, naquele momento em que foi feito o procedimento [BO], o Diego já tinha saído de casa, onde os policiais tinham solicitado [isso] a pedido do próprio pai”, afirma em entrevista (ouça abaixo).

O advogado reforça que após a realização do Bocop [boletim de registro da ocorrência policial] é que os PMs viram Diego na esquina, conforme já relatado no depoimento dos policiais à corregedoria.

Vicente também detalha ao Portal sobre o motivo de no primeiro relato à sindicância não ter sido mencionado que o desaparecido havia sido deixado no loteamento Laguna Internacional.

“Eles não tinham ciência [da abertura do IPM] e foram chamados para prestar depoimento à sindicância, não chegaram a conversar com advogado, foi um trâmite mais rápido. Nem sabiam o teor do que seria a sindicância propriamente dita então só falaram do trâmite inicial que foi o procedimento da polícia”, diz.

“Em um segundo momento, logo em seguida, quando instalaram outro procedimento do batalhão é que me procuraram e nós conversamos. Aí sim, com calma, a gente viu o que seria o procedimento, o que estava se apurando e foi dito por completo. Não só essa parte, mas foi detalhado ao máximo todo o trâmite para que não tivesse nenhuma dúvida sobre os fatos que teriam acontecido até para ajudar a investigação”.

Ainda segundo o advogado, a informação de que há um terceiro depoimento, concedido à Divisão de Investigação Criminal (DIC), órgão da Polícia Civil, em que um segundo local foi apontado como onde Diego Scott teria sido deixado não procede.

“A versão que eles deram para a PM é a mesma que foi dada para a DIC, não teve nenhuma alteração. A questão da DIC foi apenas detalhar o local para que pudesse ser feita essa investigação”, pontua. Esse local citado pelo advogado é uma área de mata, próxima da estação de captação de água da Casan, na Praia do Gi.

Disque Denúncia

A DIC abriu um canal para recebimento de informações que ajudem a elucidar o caso e solucionar onde está Diego Scott. Os telefones usados pelo Disque Denúncia são o 181, da Polícia Civil, e o (48) 9 9118-3684, da DIC. Em todos os números, a garantia do anonimato é assegurada.


Atualizado às 21h


Divulgação