Concluída na última sexta-feira, 9, a denúncia oferecida pela 2ª Promotoria de Justiça de Laguna, produzida em cima do inquérito policial da Operação Seival 2, deflagrada em 24 de setembro, já está em análise pelo Poder Judiciário. A força-tarefa liderada pelo Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco), prendeu três vereadores e um ex-secretário de obras e deteve, de maneira temporária, quatro empresários, incluindo um candidato a prefeito, liberado após depoimento.
O documento segue em sigilo judicial, mas uma cópia integral com 53 páginas vazou na sexta-feira – o Portal Agora Laguna confirmou junto ao Ministério Público (MP) a veracidade do texto. A Justiça recebeu a denúncia na terça-feira, 13, segundo documento que a reportagem teve acesso na quarta-feira (entenda adiante).
A promotora Bruna Gonçalves elencou em oito pontos os crimes pelos quais baseia a denúncia e os nomes de políticos, gestores e empresários ligados à contratos com a administração pública para serem julgados pela Justiça. Os fatos investigados foram, diz o documento, levantados após a primeira fase da Seival em 2017 e a partir de delações premiadas do ex-vereador Antônio Laureano (MDB) e do empresário Adílio Hercílio Marcelino, ex-pré-candidato a vereador pelo PL, assim como após análise de depoimentos colhidos em conversas telefônicas interceptadas e documentos apreendidos.
A denúncia aponta para a existência de organização criminosa atuante entre o final de 2016 e meados de 2018, com uma divisão articulada de funções para obtenção de vantagens indevidas, a partir da assunção no comando da Câmara de Vereadores por parte dos parlamentares emedebistas. “[Uma] sofisticada organização criminosa estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas”, analisa a promotora.
Outro crime elencado é o de corrupção ativa e passiva cometido através de uma aliança de dez vereadores para a eleição da presidência da Câmara, com base na solicitação de vantagens indevidas em troca de votos, no começo do mandato em 2017 e na eleição para o biênio de 2019, cujo mesmo crime voltou a ser identificado.
A promotora também elenca crimes de corrupção feitos com troca de cheques em solicitação de vantagem indevida e a partir de uma fraude na reforma do prédio-sede do Poder Legislativo.
“Os fatos trazidos pelas colaborações evidenciaram que a organização criminosa até então desvendada era ainda maior e mais complexa, espraiando-se por outros órgãos e entidades do Município e enredando outros vereadores do partido político que dirige os Poderes Executivo e Legislativo do Município de Laguna, bem como envolvendo a prática de vários outros crimes contra a administração pública”, descreve Bruna, no documento. O Portal tentou entrevistar Bruna Gonçalves, mas a promotora por sua assessoria informou que não irá se manifestar devido o sigilo judicial.
Denunciados
- Adílio Hercílio Marcelino, empresário e ex-pré-candidato a vereador pelo PL, preso na primeira fase da Seival – denunciado por oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, solicitar ou receber vantagem indevida no exercício da função pública ou antes de assumi-la.
- Adilson Paulino, vereador do PSD – denunciado por solicitar ou receber vantagem indevida no exercício da função pública ou antes de assumi-la.
- Alexandro Souza de Almeida, engenheiro civil – denunciado por fraude em licitações.
- Antônio César da Silva Laureano, ex-vereador e ex-secretário de Pesca e Agricultura, preso na primeira fase da Seival em 2017 – denunciado por oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, solicitar ou receber vantagem indevida no exercício da função pública ou antes de assumi-la.
- Antônio Venâncio, empresário – denunciado por fraude em licitações e por concorrer para o crime de se apropriar, enquanto servidor público, de bem ou dinheiro público em sua posse.
- Cleosmar Fernandes, vereador-presidente da Câmara e candidato à reeleição pelo MDB, alvo do desdobramento da Seival em abril de 2018, detido na segunda fase da operação este ano – denunciado por organização criminosa, crime continuado, oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, solicitar ou receber vantagem indevida no exercício da função pública ou antes de assumi-la, fraude em licitação e apropriação de dinheiro público.
- Felipe de Favéri Fernandes, engenheiro civil – denunciado por fraude em licitações e por concorrer para o crime de se apropriar, enquanto servidor público, de bem ou dinheiro público em sua posse.
- José Wilson Alexandre, engenheiro civil – denunciado por fraude em licitações.
- Kleber Roberto Lopes da Rosa, vereador e candidato à reeleição pelo PSL – denunciado por solicitar ou receber vantagem indevida no exercício da função pública ou antes de assumi-la.
- Marcos Alves Brasílicio, engenheiro civil – denunciado por fraude em licitações.
- Osmar Vieira, vereador-vice-presidente da Câmara e candidato à reeleição pelo PSDB – denunciado por solicitar ou receber vantagem indevida no exercício da função pública ou antes de assumi-la.
- Patrick Mattos de Oliveira, vereador e candidato à reeleição pelo MDB – denunciado por solicitar ou receber vantagem indevida no exercício da função pública ou antes de assumi-la.
- Paulo Uhlmann, empresário – oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público.
- Pedro João de Almeida, empresário – denunciado por fraude em licitações e por concorrer para o crime de se apropriar, enquanto servidor público, de bem ou dinheiro público em sua posse.
- Peterson Crippa da Silva, vereador e candidato a prefeito pelo DEM – denunciado por solicitar ou receber vantagem indevida no exercício da função pública ou antes de assumi-la.
- Rhoomening Rodrigues, vereador e candidato à reeleição pelo PSDB – denunciado por solicitar ou receber vantagem indevida no exercício da função pública ou antes de assumi-la.
- Roberto Alves, vereador do PP – denunciado por solicitar ou receber vantagem indevida no exercício da função pública ou antes de assumi-la.
- Rodrigo Moraes, vereador e candidato à reeleição pelo MDB – denunciado por solicitar ou receber vantagem indevida no exercício da função pública ou antes de assumi-la.
- Rogério Medeiros, vereador e candidato à vice-prefeito pelo PSDB – denunciado por solicitar ou receber vantagem indevida no exercício da função pública ou antes de assumi-la.
- Silvânia Cappua Barbosa, engenheira e ex-secretária de Planejamento Urbano de Laguna – denunciado por fraude em licitações e por se apropriar, enquanto servidora pública, de bem ou dinheiro público em sua posse.
- Thiago Duarte, vereador e ex-candidato a vice-prefeito pelo MDB, detido na segunda fase da operação este ano – denunciado por organização criminosa e solicitar ou receber vantagem indevida no exercício da função pública ou antes de assumi-la.
- Valdomiro Barbosa de Andrade, vereador e candidato à reeleição pelo MDB, alvo do desdobramento da Seival em abril de 2018, detido na segunda fase da operação este ano – denunciado por organização criminosa e solicitar ou receber vantagem indevida no exercício da função pública ou antes de assumi-la.
Próximos passos
O MP pede que os denunciados sejam condenados às sanções penais violadas, com fixação de valor mínimo para reparação dos danos e perda de cargos, funções públicas e mandatos eletivos.
O recebimento da denúncia pela Justiça, conforme decisão do juiz Pablo Vinicius Araldi, torna os 22 citados réus e eles têm prazo de dez dias para responder ao indiciamento através de um advogado a partir da notificação. Caso não tenham advogado constituído, devem consultar a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para indicar um defensor público.
Araldi também determinou que Peterson Crippa, Rogério Medeiros, Marcos Brasílicio, José Wilson Alexandre e Silvânia Cappua Barbosa, sejam intimados para manifestarem interesse ou não na celebração de acordo de não persecução penal.
O acordo prevê que o investigado confesse formalmente a prática da infração penal em que não haja violência ou grave ameaça à pessoa, e cumpra, de forma cumulativa, ou não, ações como reparar o dano, prestar serviços comunitários, pagar prestação pecuniária, entre outros.
Outras denúncias
A denúncia apresentada é considerada a primeira da segunda fase da Seival. Ainda há outros processos investigativos em andamento, mas já há ao menos um inquérito fechado. Nesta semana, começaram a vazar na internet alguns documentos ligados a outras investigações relacionadas com a Seival 2 – alguns destes com veracidade confirmada.
Nas páginas, que a reportagem teve acesso, são citados mandados de busca e apreensão nas residências de vereadores que comporiam um grupo conhecido como “G7”; além das casas do empresário e candidato a prefeito Samir Ahmad (PSL), onde há registro de recolhimento de documentos, telefone celular e munições de espingarda; e do ex-secretário de Obras, Renato de Oliveira – detido na Seival 2 e já solto – e da ex-presidente da Flama, a bióloga Aline Trichês.
Ahmad se defendeu em um vídeo nas redes sociais, onde diz que o caso é uma “fake news”. Os vereadores do suposto “G7” não se manifestaram publicamente sobre o assunto. Aline Trichês não foi localizada para comentar o vazamento.
O que é a Seival 2
A segunda fase da Seival foi deflagrada no dia 24 de setembro para apurar delitos como fraude a licitação, corrupção ativa e passiva, organização criminosa, lavagem de dinheiro e peculato, envolvendo empresários, servidores públicos e agentes políticos dos Poderes Executivo e Legislativo municipais.
As investigações analisam a participação de novos integrantes do grupo que possuem estreita ligação com as pessoas inicialmente investigadas pela polícia e denunciadas pelo MP em 2017. A operação tenta identificar a notícia da existência de uma espécie de loteamento das secretarias municipais por meio de indicações políticas e recebimento de propina correspondente a parte dos valores das obras e serviços licitados nessas pastas.
Os policiais analisaram os vários contratos firmados pela prefeitura de Laguna com empresários que há anos prestam serviço na cidade, com indicativos de superfaturamento e inexecução das obras e serviços licitados, bem como fraudes em uma licitação no Instituto de Previdência (Iprev) do estado em 2016.
O que dizem os denunciados no primeiro pedido do MP-SC
O Portal Agora Laguna entrou em contato com os citados na denúncia para ter a defesa de cada um deles na matéria. Os envolvidos mantiveram postura de cautela, pontuando que ainda não tiveram acesso ao teor do processo.
- Adilson Paulino – resposta via manifestação da defesa: “A defesa recebe a denúncia com tranquilidade, respeitando p digno trabalho da Força Tarefa (PC, PM e MPSC), entretanto demonstrará com firmeza, ao longo do processo, que o vereador Adilson Paulino não incorreu em nenhuma prática delitiva, bem como não foi apresentado nenhuma prova, sendo a denúncia baseada tão somente em indícios genéricos e suposições relacionadas a este e à informações obtidas por meio de delação premiada que carecem de comprovação”.
- Alexandre Almeida e Pedro João Almeida: optaram por não se manifestar neste momento, por ainda não terem tido acesso ao processo.
- Cleosmar Fernandes – resposta via manifestação da defesa: “O processo está em segredo de justiça e sequer iniciou a ação penal, então no momento não há qualquer informação que possa fornecer sem comprometer o sigilo processual”.
- Felipe de Faveri– resposta via manifestação da defesa: “A Defesa do senhor Felipe de Faveri Fernandes, informa que, após análise detalhada do inquérito policial, concluiu que não existe absolutamente nada de ilegal na sua atuação profissional. O que existe nos autos são ilações e interpretações equivocadas do Ministério Público, para levar a crer que o senhor Felipe de Faveri Fernandes teria cometido os crimes imputados na peça vestibular. Importante registrar que por meses de investigações, interceptações, buscas e apreensões, a Diretoria Estadual de Investigações Criminais – DEIC não conseguiu demonstrar nada que desabonasse a conduta do senhor Felipe. Em outras palavras, nada existe no processo que demonstre que o senhor Felipe tenha praticado qualquer delito. No mais, o senhor Felipe de Faveri Fernandes recebe com tranquilidade o mandado citatório, pois confia no Poder Judiciário”.
- Kleber Roberto, Patrick Mattos, Rogério Medeiros, Thiago Duarte: o advogado dos quatro envolvidos, Leandro Bento, informou à reportagem que ainda não tratou com os clientes da denúncia, logo, ainda não pode apresentar um comentário sobre as citações da denúncia da 2ª Promotoria de Justiça de Laguna.
- Peterson Crippa: “Infelizmente não posso me posicionar ainda, pois os processos correm em sigilo de justiça. Mas venho pedindo para que sejam quebrados e assim a população ter ciência da verdade. Meu caso é mentira totalmente fácil de derrubar, mas já os outros terão que falar por si. Estamos tranquilos e vamos vencer”, disse o vereador.
- Rhoomening Rodrigues: “Todos os vereadores foram denunciados por uma delação de um ex-vereador, sem provas nenhuma, em relação à presidência da Câmara e estamos sendo denunciados por isso. Agora falta o juiz aceitar ou não a denúncia e [decidir] se vai tocar ou não para frente. Acredito que não vá tocar para frente. Mas de qualquer forma, eu não fui intimado para depor. Me apresentei espontaneamente. Fui lá, até porque a gente quer saber a verdade, pois estão jogando nosso nome na rua, e fiz o depoimento direto com a promotora. Estamos à disposição da Justiça para qualquer coisa que precisar”, comentou o vereador.
- Paulo Uhlmann – resposta via manifestação da defesa: “O empresário Paulo Uhlmann, e sua empresa nunca se beneficiaram de nenhuma prática ilícita em qualquer processo licitatório do qual participou, sendo rigorosamente idôneos, bem como sempre cumpriu integralmente todos os contratos administrativos firmados com a Administração Pública. No curso da instrução processual poderá esclarecer toda e qualquer dúvida apontada pela ilustre representante do MP”.
- Silvania Cappua: “O advogado está providenciando o acesso ao inquérito e processo do MP. Estou aguardando ele verificar toda a documentação”, afirmou a ex-gestora.
Já Antônio Cesar da Silva Laureano, Roberto Alves e Osmar Vieira foram procurados pela reportagem e preferiram não se manifestar sobre o assunto. Rodrigo Moraes disse que fará sua manifestação apenas nos autos do processo.
Antônio Venâncio foi contatado por mensagem e aparentemente bloqueou o número de telefone do Portal, sem responder ou atender ligações feitas pela reportagem. Marcos Brasílio não foi localizado. As ligações para Adílio Marcelino não foram completadas e caíram na caixa postal.
José Wilson Alexandre foi procurado por mensagem e também por telefone. Respondeu à reportagem que não tinha conhecimento da operação e que qualquer assunto do tema deveria ser tratado com o seu advogado. Todavia, engenheiro se recusou a fornecer o telefone do defensor. A reportagem deixa o espaço aberto para eventuais manifestações de defesa posteriores e, se houver, o conteúdo será atualizado.